Se eu pudesse dizer
O que nunca te direi
Tu terias que entender
Aquilo que nem eu sei

Fernando Pessoa

terça-feira, 28 de junho de 2011

Não sei o que dizer... não sei como dizer... vou apenas escrever com o coração


Uma amiga e madrinha da minha filha Lu escreveu um livro onde relata a sua experiência de "mãe especial" de um "anjo emprestado".

Tenho os meus olhos marejados de lágrimas, de uma culpa sentida. Culpa de não estar presente, de não "querer saber", de me afastar, de também não querer sofrer.

Como mãe sei o que é nos "tirarem o chão", de sofrer em silêncio, rezando por um amanhecer diferente. Sei por experiência (que não tem sequer comparação possível!) o que é nos tirarem o nosso filho acabado de nascer dos braços. Sem futuro certo, pois a incerteza essa é certa. 

A Lu nasceu antes do tempo e antes do tempo também experimentou o sofrimento de ficar sem o calor da mãe, numa incubadora fria e estéril de amor. 
Pediram-me que me despedisse dela e deixaram-me sozinha com todos os meus sonhos por terra. Felizmente as coisas correram bem para a Lu! E posso tê-la comigo, amá-la, mimá-la todos os dias da nossa vida...
Mas nunca esquecerei aquelas horas, dias e meses de "coração na mão" 

Passados 4 anos o pesadelo volta e o J.T é arrancado dos  meus braços e levado para uma incubadora fria e estéril de amor. E mais uma vez fico sozinha com os meus sonhos por terra. E a esperança desfeita de que desta vez seria completamente diferente. Todos os exames foram realizados, todas as dúvidas... mas o Universo assim não quis. 

Mais uma vez... e nem a experiência prévia me aliviou o coração, muito pelo contrário. A sorte não me bateria á porta duas vezes! Afinal... bateu...

E porque eu durante meses achei que nunca  iria amar  o J.T. tanto como á Lu foi necessário passar por esta  provação para aprender. Aprender que o amor não se divide, multiplica-se...

Hoje o J.T. e a Lu são saudáveis e raramente adoecem. Costumo em brincadeira dizer que eles assustaram  tanto a mãe á nascença que valeu por uma vida inteira.

Vivi duas vezes a inconsolável derrota, duas vezes saí de casa com o meu filho no ventre e duas vezes entrei em casa com os braços vazios. Chorei... muito, sofri... como uma mãe sofre quando vê o seu filho sofrer (duplamente, por ela e por ele). 

Mas por duas vezes venci a batalha e o que não me derrotou fotaleceu-me.

É inexplicável a dor que se sente, não existem palavras para a descrever talvez porque ela não venha para ser descrita mas para ser vivida!
Como mãe experienciei a dor mais atroz.
Isso não é justo! Nenhuma mãe deve sofrer assim! 

Afastei-me de tudo o que signifique este sofrimento tão único, tão ensurdecedor, tão sem palavras. Por não saber o que dizer, o que fazer... Porque o meu conflito interno de dizer ou não dizer é gigantesco. Porque não queria reviver vezes sem conta este sofrimento.

Porque como profissional de saúde vi muitas vezes a dor de uma mãe que segura o corpo inerte de um filho... que perde um filho...e nunca soube lidar com isso, principalmente depois de ser mãe. Porque empatizo, porque sofro antecipadamente.

Como ser humano não me queria permitir a sofrer e por isso me afastei. Porque sou falível, porque sei o tamanho da dor, porque sei que não existe consolo possível...

Se eu ainda hoje lido mal com as minhas dores (quando elas dizem respeito aos meus filhos), com as minhas perdas, como consolar o inconsolável?

Apenas posso pedir desculpa a todos pela ausência, mas os caminhos ás vezes querem-se solitários, sem pudores, sem falsas penas. Apenas posso assegurar que tentarei estar mais presente...

A ti Cristina (e Jorge) permito-me dizer que o vosso "anjo de luz" veio enriquecer a vossa vida, determinar o vosso caminho e vos fazer companhia. Mesmo sem saberem esse vosso ser de luz escolheu este caminho para vos auxiliar, para vos ensinar... para nos ensinar!

Especialmente a ti, Cristina, posso  dizer-te que és uma "mãe coragem", uma mãe que admiro muito, que prezo e a quem confiaria a minha filha sem pestanejar. Porque amas como ninguém, porque vives como ninguém uma experiência tão enriquecedora.

Aqui vos asseguro que sempre contaram com a minha solidariedade. 

Estou a aprender nesta minha caminhada a ser melhor, a sentir com qualidade, a viver e a amar. Mas como ser humano ainda dou uns trambolhões valentes!!!

Com um grande beijo para ti Cristina, Jorge, Pedro e Diogo (o vosso, e nosso, anjo emprestado).